quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Capítulo XLII

No capítulo anterior...

- A turma de Kevin promete se vingar de Dudinha.
- Branca Helena deixa a casa da avó.
- Doutor Epaminondas ameça Levitraz.


Floribunda se despede da amiga no portão e corre saltitante para dentro de casa:
– DÊê! DÊê! Novidade pra vocÊê! DÊê! DÊê! Novidade pra vocÊê!
– Que foi, mulher? Que gritaria é essa?
– A minha Amiga, Grande Amiga Lud, vai me dar uma casa e montar um negócio para eu me sustentar! Não é maravilhoso! Ô benção! Ô glória! Um salva de palmas pra Jesus!
Desirée se queda imóvel por alguns instantes, boquiaberto, para depois cair ali mesmo, no meio da sala, de joelhos, exclamando com uma voz grossa e entrecortada:
– Graças! Graças, meu Deus! Graças a Deus! Eu sabia: Deus existe! Existe e não me abandonou!
– Credo, Dê! Até parece que você estava querendo que eu fosse embora logo! Assim até ofende!
– Não, querida, imagina! Eu só estou feliz é com teu sucesso. - falou entre irônico e aliviado.
– Então vamos passar a manhã de hoje comemorando. – E pulou em cima do Desirée, coitado, que não teve tempo nem de gritar.
Três comemoradas e meia depois, Floribunda dá o golpe de misericórdia:
– Dê, menino guloso, pulou em cima de mim com tanta vontade que nem terminei de dar a boa notícia. Quer dizer, as boas notícias!
Mas morto do que vivo, um palmo de língua de fora, Desirée apenas grunhiu.
– Sabe pra onde é que vou me mudar? Para a casa vazia aqui do lado! E sabe qual o negócio que minha amiga vai me dar? Um trailer de cachorro quente, que vou chamar de Hot Dot, e que vai ficar bem em frente ao trailer da cascavel choca.
Por toda Ovelhópolis, que já estava ficando acostumada a gritos estranhos, ecoou o berro de Desirée.


Ludmárcia chegou em casa feliz da vida por poder ajudar sua amiga. Agora, mais tranqüila, sentia que chegara finalmente a hora de se dedicar a ir em busca do seu passado, de sua família, de sua gente.
Estacionou o carro e ao longe viu, à borda da piscina, Ivanir teclando desesperadamente num notebook. Pensou logo:
- Um computador! Vou pedir emprestado para eu poder procurar no Google o nome de algum detetive que possa me ajudar em minha busca.
Ela só não se deu conta de que na biblioteca, em todos os quartos, no banheiro e na dispensa da mansão existia um computador de última geração com acesso à internet banda larga, nem muito menos de que aquela necessidade urgente de usar um computador não passava de um artifício bobo e ingênuo do seu coração para poder se aproximar de Ivanir.


Ivanir, completamente desesperado, havia ido à biblioteca para acessar a internet e procurar no Google (olha que coincidência!) o nome e o contato de bancos, instituições financeiras, agiotas, mafiosos, bicheiros, traficantes, enfim, pessoas que pudessem lhe emprestar algum e o ajudar a sair daquela enrascada. Estava quase se obrando de medo de ir parar na prisão. Ouvira dizer que homem que tenta matar a mulher grávida num atentado, valendo-se de animais ferozes para simular um acidente, “cai nas graças” de todos os presos da penitenciária. Não é bom nem pensar!
Estava assim procurando desesperadamente levantar a fabulosa soma de cinco milhões de dólares, quando entra na sala seu algoz, Levitraz:
– Olá! Devedor Ivanir! Tudo azul? Espero não estar incomodando, é que eu já tomei meu banho de sol e agora está na hora de eu vir aqui ler meu romance. – Ivanir mordia os beiços de ódio e desespero. – Hum, deixa eu ver, onde foi que eu guardei... Ah, está aqui! Olha que legal, devedor Ivanir: “O Espião que Sabia Demais”, de John Le Carré. Não sei porque, achei esse livro a minha cara. Tomara que o espião se dê bem e fique com toda a grana no final. Ah, por falar em grana, já arranjou o dinheiro para pagar meus honorários? Já fez aquele CDCzinho esperto? Ah, olhe, se você conseguir em real, não leve a mal, não, mas eu gostaria que você convertesse para dólar. Em real eu não aceito receber, só trabalho com dólar, sim?
Ivanir suspirou fundo, contou de um a dez, contou de novo de traz pra frente, fez respiração cachorrinho, recitou o mantra AUM, mas vendo que nada adiantava e que se permanecesse no mesmo cômodo que Levitraz iria sair dali acusado de dois crimes, tentativa de homicídio e homicídio, saiu quase chorando, quase correndo, tropeçando aqui e acolá, abraçado ao seu notebook com o modem de internet sem fio balançando. Foi para a piscina.



O trio ternura, Branca, Duda e Taviano, dobraram a esquina da casa de Dona Calô e só então “caiu a ficha” dos três. Para onde Branca iria?
Branca olhou em direção a casa em que passara toda sua infância e adolescência e bateu aquela nostalgia:
– “Saudosa maloca, maloca querida, que dindonde nóis passemo dias feliz das nossas vidas.”
– E agora, Branquinha, pra onde você pensa ir? – falou com dificuldade Taviano, que se esfalfava para carregar a mala da namorada, mala esta que parecia conter chumbo derretido em vez de roupas.
– “Eu não sei dizer O que quer dizer O que vou dizer... Se eu não sei dizer O que quer dizer O que vou dizer... Se eu digo: pare! Você não repare No que possa parecer. Se eu digo: Siga! O que quer que eu diga, Você não vai entender. ” – a coitadinha estava mesmo confusa.
Dudinha foi quem tentou organizar a confusão mental:
– Gente, eu sei que é difícil, mas a gente tem que pensar onde a Branquinha vai ficar agora que saiu de casa, não tem dinheiro, nem emprego, nem nada.
Desesperada, Branca desandou a falar chorando, num ataque histérico:
– Meu Deus do Céu, na raiva nem pensei nisso. “E agora, José ? A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite esfriou, e agora, José ? Com a chave na mão quer abrir a porta, não existe porta; quer morrer no mar, mas o mar secou; quer ir para Minas, Minas não há mais. José, e agora ? Se você gritasse, se você gemesse, se você tocasse a valsa vienense, se você dormisse, se você cansasse, se você morresse… Mas você não morre, você é duro, José !”
– Calma, Branquinha. – e Duda não sabendo mais o que fazer, atacou também com uma frase feita. – “Nessa vida pra tudo se dá um jeito. Só não tem jeito pra morte.”
– Tem minha casa, mas... – Taviano estava meio relutante.
– Pra sua casa, não! – Dudinha quase gritou. Foi momentaneamente privado da razão por causa de uma pontada forte de ciúmes. Muito sem jeito, encabulado, tentou disfarçar: – É que sua casa, Taviano, é muito longe do centro...
Taviano que tinha razões para não poder levar ninguém para sua casa, gaguejando, se valeu logo daquela desculpa:
– É! É me-mesmo! Minha casa é muito afastada do centro. Não dá certo.
– Lá na UÓ tenho quase certeza que não vão permitir uma pessoa que não é aluna ficar morando no Campus...
– “O que é que eu vou fazer com esse fim de tarde?” – perguntou Branca com cada olho que parecia umas bolas de bilhar de tão arregalados de medo.
– Você vem para minha casa, filha! – falou uma voz atrás do trio ternura.
Os três, surpresos, se viraram ao mesmo tempo e deram de cara com Floribunda de braços estendidos para a filha.



Lucrécia estava de cócoras atrás de uma moita de comigo-ninguém-pode, escondendo-se de Levitraz e da irmã, rezando para que ninguém a encontrasse ali.
Já era quase uma da tarde e a megera tinha acabado de almoçar um pedaço de pão seco e dormido que roubara da cozinha, quando a moita começou a se balançar, tremelicar. O coração de Lucrécia disparou.
As folhas se afastaram, então, e uma cara cínica apareceu:
– Açôôôôô! – exclamou Levitraz com uma voz fininha e irônica. – Vendo você aí de cócoras no meio das formigas, eu poderia jurar que você está se escondendo de mim e de sua maninha...
– Pxiiiii! Cala a boca, diabo, fala baixo!
– Lulu Sapinha, chega de brincar de esconde-esconde e vá logo se arrumar para você ir a luta, minha filha. Ou você acha que meu dinheiro vai cair do céu?
- Poxa, cara, tu é foda! Me diz: onde é, pelo amor de Deus, cara, que eu vou conseguir um milhão de dólares? Me diz.
- E eu sei? Isso é problema seu, Lulu Camufla! Dê seus pulos.
- Só se eu pular no teu pescoço, diabo, e te esganar!
- Ahahahah! Você é uma pândega. - e subitamente sério, o que fez gelar o sangue da megera. - Eu quero o meu dinheiro daqui para o final da semana.
- Final da semana!!! Você pirou, porra? Olha, Levitraz, tu tá muito doido, cara, muito doido!
- Quem pirou foi você, sua égua! - pensou nas ameças do Doutor Epaminondas. - Está pensando que eu tenho todo o tempo do mundo, sua idiota? Te vira, minha filha, te vira. Ou eu acabo com teus planos e tu volta para miséria de onde tu veio.
Lucrécia quase se borrou.




Ludmárcia foi decretada falar com Ivanir.
– Bom dia!
– O que tem de bom? – o rapaz estava tão desesperado que nem a beleza estonteante de Ludmárcia o comoveu.
– Grosso! – admirou-se a moça, pondo a mão no coração, que disparava loucamente.
– Você ainda não viu nada! – Ivanir não precisava soltar mais essa grosseria.
– Senhor, eu só vim aqui po-porque-que estou precisando usar urgentemente um computador.
– E eu com isso? – Ivanir falava com ela sem levantar a vista, não queria se distrair do que fazia, já havia encontrado o nome e o contado de 57 bancos, 30 financeiras, 27 agiotas e ainda faltava pesquisar os traficantes, os bicheiros e os proxenetas.
– Como “eu com isso”? Você está usando um computador e eu estou precisando de um por um instantinho apenas. O senhor poderia me emprestar, por obséquio?
– Não. – e continuava a teclar.
– Como “não”? O senhor é muito mal-educado, nem parece sobrinho do seu tio.
– Bla-bla-blá! Por que não vai se queixar para o PROCON?
– Estúpido! – Sempre muito calma, aquele homem era o único que conseguia tirar Ludmárcia do sério. A pobrezinha, de tão humilhada, estava quase chorando. Ficou tão irritada, mas tão irritada e perturbada, que perdeu a razão e fez o inconcebível: adiantou-se e tomou o notebook de Ivanir a força: – Me dá isso aqui!
– Epa! Me devolve já esse computador. – gritou indignado Ivanir, pondo-se de pé.
– Devolvo coisa nenhuma! Estou precisando pesquisar uma coisa urgente no Google e vou pesquisar.
– Não vai nada. Dá isso aqui, dá!
– Não dou! - ¬ e bateu o pé fazendo birra. ¬ Não dou, não dou e não dou!
E começaram a disputar o computador num cabo-de-guerra no mínimo ridículo. O que Ludmárcia não percebeu é que estava de costas para a piscina e muito próxima à borda. No calor da discussão e do cabo-de-guerra, tropeçou no batente, se desequilibrou e caiu de roupa, computador e tudo na piscina.
– Meu computador! – desesperou-se primeiramente Ivanir. Só depois de praguejar muito é que notou que Ludmárcia não sabia nadar e estava se afogando.
O instinto de quase-médico e homem falou mais alto e ele já tirava a camisa para pular na piscina para salvar aquela bela mulher, quando uma mão o puxou para trás:
– Ah, não vai, não, quem vai salvar a dama e lhe aplicar uma respiração boca-à-boca sou eu.
– Alfred?! – admirou-se Ivanir com a ousadia do ex-mordomo, atual motorista, sempre contidíssimo, quase um lorde inglês. – Mais que liberdade é essa?
E a pobre subindo e descendo, afogando-se. Na sua mente de afogada somente uma coisa: a música do Fagner: “Quem dera ser um peixe Para em teu límpido aquário mergulhar...”
– Não, senhores, quem vai sou eu!
– Até tu, Ralph? – preso pelo outro braço pelo ex-motorista, agora jardineiro. – Mas o que é que está acontecendo aqui?
– Vai é uma porra, Ralph! Eu sei que você não gosta da fruta, quem vai sou eu! – Levitraz deu uma gravata no Ralph. – Eu também sou filho de Deus e não vou perder talvez a única chance de dar um chupão na gostosona do folhetim.
E assim foi vindo todos os empregados da casa para disputarem no muque o direito de salvar a linda senhorita e aplicar-lhe um chup... quer dizer uma respiração boca-à-boca. Era um bolo de briga mais horrível do mundo. Ivanir lutando com unhas e dentes para se desvencilhar daquelas mil mãos. E a pobre da Ludmárcia já bebendo quase a metade da água da piscina.
– Soc...glub! Glub! Glub! - Blu-blu-blu! (barulho das bolhinhas de ar e de Ludmárcia engolindo água)! Alg... glub! glub! Glub! Glub! Blu! Me ajud... glub! Glub! Glub! Blup! Blup! Gent... glub! Glub! Glub! É séri... glub! Glub! Glub! Estou me afog... glub! Glub! Glub!
De repente, alguém cai na água, cruza a piscina num nado torpedo-crawl, parecendo o Aquaman, e alcança a moça que se debatia em apuros, no meio da piscina. O tempo pára e todos param de dar chute, murros, de enfiar o dedo em olhos alheios e se voltam ao mesmo tempo.
Com muita elegância e desenvoltura, Alcione, pois foi ele quem se atirou na piscina, segura gentilmente Ludmárcia pelos cabelos e nada até a borda. Dá um mergulho rápido e emerge, um verdadeiro príncipe de desenho animado japonês, trazendo a moça desacordada nos braços como se trouxesse uma toalha molhada, sem fazer nenhum esforço aparente.
Delicadamente e sob vários olhares invejosos e rancorosos, ele depositou-a na grama, posicionou-se, puxou a cabeça da moça para trás – (fazia-se um silêncio de cobrança de pênalti em final de FLA-FLU), tomou fôlego, preparou-se e... GOOOOOOOOLLL! Aplicou a tão cobiçada respiração boca-à-boca, que por sinal se prolongou por um tempo além do necessário.
– Maij o que é que xignifica ixo? – a voz furiosa de Doutor Epa rugiu feito um trovão, quebrando o clima e quase matando todos de susto.


CENAS DO PRÓXIMO CAPÍTULO

Floribunda faz proposta indecente para a própria filha;
• Doutor Epaminondas desconfia das intenções de Alcione;
• Desirée conta as novidades para Paloma



2 comentários:

  1. AAAAAAAAAAAAAHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHH!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! Lindo! Lindo! QUe blog mais lindo! AAAAAHHHHHHHHHH!!!!!!!!!!!! Tirando a minha foto com cara de louca, mas o resto tá lindoooooo!!!!!!!!!!!!!!!

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  2. Quero +++++++++++++++++++++++++ Buáaaaaaaaaaaaaa
    Aldéa

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